A Metafísica Dos Costumes E O Fundamento Moral

30/06/2013 13:06

A METAFÍSICA DOS COSTUMES E O FUNDAMENTO MORAL

 

*Marister Magalhães Frota Prado

 

RESUMO

A obra Metafísica dos Costumes (1797) trata dos fundamentos da moralidade kantiana no campo do Direito e da Virtude. Ambos caracterizando-se pela autonomia da vontade e pelo imperativo categórico da Razão. O Direito é aplicado no âmbito externo da ação que é identificado como heteronomia, enquanto a Virtude á aplicada no âmbito interno do agir que se identifica com a autonomia (ética). Quer no Direito ou na Virtude a autonomia da vontade está voltada para a questão da liberdade no convívio intersubjetivo dos homens no seio da sociedade, explicando assim o porquê de haver uma “coação tanto externa quanto interna”. O Direito que se restringe a considerar a ordem das ações humanas exteriores explica como se dá a posse física ou sensível ou a posse inelegível, podendo ser identificado como Direito Privado e Direito Público e este explicando como se dá o Direito das Gentes e o Direito Cosmopolita. A doutrina da Virtude explica as bases para se pensar um fim que é também um dever; as condições subjetivas da receptividade do conceito de dever; o que vai distinguir a doutrina da virtude do Direito e finalmente os elementos que vão dar configuração a ética que se resume em deveres para consigo e para com os outros.

ABSTRACT

The work Metaphysics of Morals (1797) deals with the fundamental Kantian morality in the field of Law and Virtue. Both are characterized by autonomy and the categorical imperative of reason. The law is applied in the external action that is identified as heteronomy, while Virtue will applied within the internal act which is identified with autonomy (ethics). Either in law or in Virtue freedom of choice is focused on the question of freedom in living intersubjective men in society, thus explaining why there is a "both external and internal coercion. The law that restricts itself to consider the order of human actions outside explains how to give physical possession or possession or sensitive ineligible and may be identified as Private Law and Public Law and this explains how it is the Right of the People and Cosmopolitan Law. The Doctrine of Virtue explains the basis for thinking that an end is also a duty; the subjective conditions of receptiveness to the concept of duty, what will distinguish the doctrine of the virtue of law and finally the elements that will make setting the ethics that sums on duties to himself and to others.

 

I. INTRODUÇÃO

Após o seu despertar dogmático, como ele mesmo expressou, o filósofo Immanuel Kant elabora uma filosofia desvinculada do empirismo cujo

Immanuel Kant 1724-1804

(Photo Credit:  Alessandro Volta (Flickr.com) Used under the Creative Commons License.)

reforço doutrinário repousava na idéia que somente as experiências seriam capazes de gerar conhecimento e formular as teorias científicas. Em contrapartida a filosofia kantiana seria aquela que demonstraria um sistema, notadamente na obra ora em discurso, A Metafísica dos Costumes (1797) que evitasse o ceticismo de David Hume, pois, ao encerrar a natureza humana apenas ao âmbito experimental beneficiando apenas o instinto e a emoção, reduziu o homem à quase totalidade animal, deixando-o desprovido da natureza racional e espiritual.

Kant propõe a exaltação da racionalidade humana na expressão da liberdade, enquanto Hume coloca a liberdade na dimensão da espontaneidade sem a coação externa de modo que a razão não poderia jamais se contrapor à paixão na condução da vontade; portanto, a paixão seria o guia determinante desta vontade, ou seja, da vida moral. Ao que Kant assume posição contrária dentro do discurso.

Kant demonstra através de uma metodologia crítica, isto é, uma análise reflexiva que é possível remontar o conhecimento às condições que tornam legítima o pensamento filosófico. E recorrendo ele à racionalidade como objeto do estudo de onde tira todos os princípios apriori da conduta humana e os fundamentos tanto da ética como da moral, promovendo assim a liberdade e identificado-a como “Autonomia da vontade” que uma vez influenciada pela razão, torna-se propriedade de todos os seres racionais.

A “autonomia do querer ou da vontade” ganha centralidade dentro do discurso e também explica o ponto culminante da subjetividade que no escopo da vontade moral reside a força suprema da filosofia kantiana cujo fundamento é a natureza racional humana. Para isto recorremos à obra supracitada, pois ela servirá de base para o presente trabalho. Apresentamos em forma de artigo e procuraremos através de uma elaboração sucinta explicar seu fundamento moral.

 

II. DESENVOLVIMENTO:

O fundamento moral da filosofia kantiana repousa sobre dois temas: a Doutrina do Direito e a Doutrina da Virtude sendo esses os dois temas da divisão da referida obra. Esses dois temas são universais dentro do discurso filosófico, ambos amplos em si mesmos e cada filósofo dá um conceito diferenciado na abordagem, mas em Kant ambos os temas podem se harmonizarem intrinsecamente como também neles há toda uma peculiaridade no discurso filosófico da modernidade – a questão da subjetividade.

Sabendo que ambos os fundamentos são caracterizados pela autonomia da vontade e pelo imperativo categórico da Razão que segundo ele é uma regra prática pela qual uma ação em si mesma contingente é tornada necessária 2·. Então se pode afirmar que o Direito é aplicado no âmbito externo da ação que é heteronomia e a virtude é aplicada no âmbito interno do agir (ética) que é autonomia.

Kant afirma que o homem pertence a dois mundos: o sensível ou fenomênico onde esse homem se submete às leis da natureza e o mundo racional, onde ele é livre, pois a razão é uma faculdade que cria leis. Por isso a liberdade ou autonomia da vontade assume dois sentidos: primeiro, como liberdade positiva – aquela que cria leis para si; segundo, como liberdade negativa – aquela que traduz o momento em que o indivíduo age pela razão, desvinculado de toda lei da natureza e se submete somente às leis da razão independente das condições empíricas.

Quando o ser humano livre age pela determinação da “Razão” (lei moral) deve produzir uma Boa Vontade que é o bem supremo e incondicional que se identifica com o “agir por dever,” sem nenhum interesse. Isto Kant expôs muito bem na obra anterior cujo título é Fundamentos da Metafísica dos Costumes cito:

A boa vontade não é boa por aquilo que promove ou realiza, pela aptidão para alcançar qualquer finalidade proposta, mas tão somente pelo querer, isto é, em si mesma, e, considerada em sim mesma, deve ser avaliada em grau muito mais alto do que tudo o que por seu intermédio possa ser alcançado em proveito de qualquer inclinação ou mesmo, se se quiser da soma de todas as inclinações.3

O autor aponta as possibilidades do “agir”, por exemplo: por interesse, isso quando não está presente a Boa Vontade, ou seja, o agir por simples “Dever”. Estas ações são motivadas a partir de um interesse pessoal e egoísta. Mas, o agir por Dever é uma ação de tendência espontânea, é agir por um sentimento em respeito à lei moral, como ele mesmo expressou: “a simples conformidade ou não conformidade de uma ação com a lei, independentemente do motivo para ela, denomina-se sua legalidade (licitude), mas aquela conformidade na qual a idéia de dever que emerge da lei é também o motivo da ação é chamada de sua moralidade.” 4

Com relação a autonomia da vontade, que diz respeito ao Direito e a Virtude, o tema se volta para a questão da liberdade no convívio intersubjetivo dos homens no seio da sociedade; daí porque o Direito vai exigir como motivação a coação externa nas relações: do homem com os seres que não tem direitos nem deveres – os animais; do homem com os seres que têm direitos e deveres – os outros homens; do homem com os seres que só têm deveres e não tem direitos – os escravos; do homem com um ser que só tem direitos e nenhum dever – Deus.

Sabendo que o direito é uma doutrina que se restringe a considerar a ordem das ações humanas exteriores, pergunta-se: através de que esse direito se dará? Ou como ele se distinguirá? Primeiro, através da “posse”; segundo, esta pode ser tanto uma posse empírica ou sensível ou posse inteligível. A posse física diz respeito àquilo que se tem externo sob meu poder; e a posse inteligível é a posse jurídica do objeto, sem que para isso se possa estar ocupado com ele.

A partir desse pressuposto Kant vai explicitar como está dividido o Direito, explicando desta forma: Direito Privado (podendo distinguir-se em Direito de Propriedade, Direito Contratual e Direito Pessoal), Direito Público, Direito das Gentes e Direito Cosmopolita.

Logo no início da primeira parte relativa ao Direito Privado, no tocante ao que é externamente “meu” ou “teuem geral Kant afirma: “é juridicamente meu (meum iuris) aquilo com o que estou de tal forma ligado que o seu uso por parte de outrem sem meu consentimento me prejudicaria. A condição subjetiva de qualquer uso possível á a posse.” 5A propriedade será então o primeiro item na abordagem do Direito Privado e pode ser dividido assim: 1) no que tange à matéria ( o objeto) adquiro ou uma coisa corpórea (substância), ou a prestação (causalidade) de uma outra pessoa, ou a própria pessoa, isto é, o estado desta pessoa na medida em que eu obtenha um direito de dispor em torno dela (ter relações com ela).2) No que tange à forma (o tipo de aquisição). 3) No que tange à base da aquisição no direito.6 Aqui estão inclusas a aquisição de terras, servos, esposa ou outras propriedades.

O Direito Contratual se dará no ato de escolha unida a duas pessoas e ela pode ser gratuita – por se referir a bens confiáveis como empréstimo e doação. Pode ser oneroso – quando se referir a transferências de bens e troca de mercadorias; compra e venda e empréstimos para consumo e também o contrato sem nenhuma aquisição – entrega e aceitação simultânea de penhor, quando se assume responsabilidade pelo o outro a ser fiador.

O Direito Pessoal dar-se no estado do outro em relação a mim, aqui está incluso o direito matrimonial – quando um homem adquire uma mulher, cabendo-lhe o comando e esta o obedecendo e o direito do chefe do lar – quando um casal adquire um filho cabendo-lhe o dever de alimentá-lo, educá-lo, orientá-lo e dele cuidar. Esse direito se estende também quando o chefe do lar adquire um criado cabendo-lhe o dever de não desgastar nem consumir o servo demasiadamente.

O Direito Público trata do conjunto de leis que precisam ser promulgados tornados oficialmente públicos. Para isso o Estado assume a coisa pública, pois é a união de indivíduos em condição jurídica com interessem em comum.

O Direito das Gentes tratará dos direitos das gentes e dos Estados nas suas relações recíprocas. Os elementos do direito dos Estados são empregados na relação entre si num estado de natureza não jurídica na condição de guerra e findando-se esta guerra se estabelece o que Kant chama de “paz perpétua” eis porque é necessária uma confederação, pois esta liga as nações com uma idéia de um contrato social até esta confederação ser dissolvida pelo estabelecimento desta paz.

O Direito Cosmopolita será definido como a possível união de todas as nações com vistas a certas leis universais para o possível comércio entre elas. Assim finda o conteúdo da primeira parte da obra Metafísica dos Costumes evidentemente tudo exposto foi de maneira sintética. Então Kant entra na segunda parte que trata – A Virtude.

Quando se falar de Virtude há de se em falar de Dever, como já falamos anteriormente. Mas como falar das bases para se pensar um “fim” que é também um “dever”? Kant apresenta a perfeição e a felicidade como esses fins. A perfeição porque o homem cultiva a sua própria perfeição através da instrução para corrigir seus erros. Esse é um dever meramente ético, pois é uma lata obrigação, isto é, o natural ruma ao racional. Também o homem como indivíduo cultiva sua moralidade, ou seja, ele conduz a sua vontade a mais pura disposição virtuosa, age pelo simples dever acatando a lei a partir do próprio dever o que o autor classifica como perfeição interior, moralidade – estrita obrigação.

Também nos surge outra interrogação: quais a condições subjetivas da receptividade do conceito do dever? Kant apresenta de três maneiras: primeiro através do sentimento moral que é capacidade do ser humano sentir prazer ou desprazer a partir de estar ciente de sua ação ser compatível ou contrária à lei do dever. Segundo, através da consciência que equivale a ter um dever de reconhecermos os deveres, pois a consciência é da razão prática que sustenta o homem diante dele quer para sua absolvição ou condenação. Aqui não é dirigida ao objeto, mas ao sujeito simplesmente. Terceiro através do amor aos seres humanos e esse amor em Kant é um amor benevolente que se refere ao fazer o bem aos outros seres humanos na medida da capacidade do dever. E por último através do respeito que tem o sentido de reverência.

Quando Kant coloca a Virtude na mesma dimensão do Direito havendo entre os dois conceitos intrínsecos o que se pode colocar como um princípio que distinguirá um do outro é exatamente o conceito de liberdade que é a autonomia da vontade que se dará como um princípio interior – quando o ser humano submete e subjuga os afetos e paixões ao domínio da razão. E a liberdade externa quando se refere ao Dever

Falando-se então de Dever entramos finalmente no elemento fundamental na doutrina moral kantiana e esse dever se refere tanto para consigo como para com os outros. Quando Kant se refere ao dever para consigo ele apresenta primeiramente no que tange o dever do homem com relação da sua animalidade; aqui o ser humano deve preservar a si mesmo como indivíduo, por exemplo, preservar sua vida. Aqui Kant se opõe ao suicídio, pois o coloca dentro do quadro do crime e afirma: “um ser humano não pode renunciar à sua personalidade enquanto for um sujeito do dever (...) enquanto viver, e constitui uma contradição (...) aniquilar o sujeito da moralidade na própria pessoa é erradicar a existência da moralidade mesma do mundo (...)”. 7 Também se opõe a automutilação ou venda dos órgãos, isto é bem atual e cabe muito bem dentro do nosso contexto e ele vê como forma de matar a si mesmo parcialmente, cita:

Privar-se de uma parte ou órgão integro (mutilar-se – por exemplo, ceder ou vender um dente para o transplante na boca de outrem, ou vê-se castrado a fim de obter um meio de vida fácil (...) são formas de matar a sim mesmo parcialmente. 8

Dentro da preservação do homem quanto à sua vida animal racional Kant aponta como degradação de si mesmo aquilo que ele chama de concupiscência a violação natural dentro do casamento, isto é, a união do mesmo sexo, o vício, a embriaguez a glutonaria.9 Continuando no dever para consigo mesmo o autor coloca o homem dentro dos deveres no que tange a sua moralidade que é agir através do sentimento benevolente, com gratidão, com respeito e solidariedade. Isto é positivo por que ordena e é ampliativo porque faz do objeto de sua escolha o seu fim. O contrário disso diz Kant é o ódio, o vício, a avareza, a falsa humildade e o servilismo.

Nos deveres do homem com relação à sua moralidade já estão inclusos os deveres para com outros que são: 1) a beneficência – é o agir que traz uma satisfação em ver a felicidade (bem-estar) dos outros sem esperar algum retorno. Assim expressa o autor: “a benevolência pode ser limitada, uma vez que nada precisa ser feito com ela (...) mas a felicidade dos outros é, portanto, um fim que é também um dever (...) a felicidade dos outros também inclui seu bem estar moral (salubritas moralis)” 10O contrário é a inveja.

O segundo ponto é a gratidão – é o agir que promove a honra a uma pessoa, dando-lhe o que é devido a um benefício que este lhe concedeu. O contrário é a ingratidão. 3) a solidariedade – é o agir jubiloso que envolve em ter tristeza participativa em socorrer o seu semelhante na sua necessidade. Embora sendo dois sentimentos antagônicos que fazem parte da natureza humana, mas quando usados para promover o bem, então se torna um “dever da humanidade”. O contrário é o escárnio e a malícia. E a violação de todos estes é a soberba, a degradação e o escárnio. O Dever é a suprema ação da subjetividade.

A idéia do Dever em Kant não deve ser entendida de acordo com a capacidade de cumprir a lei, que é atribuída a todos os seres humanos, mas com a capacidade moral de o homem dever estimar a lei, a qual comanda categoricamente, e assim, de acordo com o conhecimento racional do que devem ser venha estar em harmonia com a idéia da humanidade, não mais de acordo com o conhecimento empírico. 11 E o valor desta lei está impressa na própria interioridade humana: “duas coisas me enchem a alma de admiração e de estupor: o céu estrelado sobre mim e a lei moral dentro de mim”. 12

 

III. CONCLUSÃO:

Como se observou desde o começo deste artigo, o fundamento moral da filosofia kantiana repousa sobre o “Dever”. O que isso pode acrescentar à filosofia? Ora, a filosofia, em suas longínquas origens, surgiu como uma tentativa do homem explicar o mundo em que vivia, contrapondo-se as narrativas míticas. Somente Século V é que se pode falar no surgimento de uma filosofia da conduta, tanto através dos Sofista e posteriormente com Sócrates. Então surge a reflexão moral.

As inquietantes perguntas socráticas trazem para o centro filosófico os problemas da vida humana. Platão e Aristóteles vão se interessar de igual modo pelo mesmo tipo de investigação, no tocante ao agir moral, portanto, elaboram, especialmente Aristóteles, o paradigma moral teleológico, o qual procura determinar a forma correta do agir de acordo com um certo fim (telos) a ser atingido. Esse fim a ser alcançado é a justificativa para as nossas ações, é a busca da felicidade. Para esse modelo ético da ação humana, a qualidade moral depende das conseqüências que dela advêm.

Muitos séculos se passaram até que a soberania deste paradigma foi superada mediante a ética deontológica de Kant. A obra de Kant na história da filosofia moral é a instauração de um paradigma no qual não se ocupa mais com a determinação do que seja virtude, nem com as regras morais que devem ser seguidas para que se alcance determinados fins, mas, tão somente, com o estabelecimento do “dever” a partir do qual a ação deve ser executada.

Em sua proposta Kant não vai determinar, melhor dizendo, ele não vai se perguntar: o que “devo fazer para ter uma vida boa e feliz”? Mas o seu questionamento é: “como devo agir para que minha ação seja avaliada corretamente”? Neste contexto é que surge a máxima “devo proceder sempre de maneira que eu possa querer também que seja uma lei universal” 13

A filosofia de Kant é chamada de revolução copernicana, pois o autor propõe a inversão do conhecimento. O pensamento anterior a Kant era proposto assim: as teorias adequavam a razão humana aos objetos, que eram por assim dizer o centro da gravidade e agora a proposta kantiana é os objetos teriam que se regular ao sujeito, que seria o depositário do conhecimento. As leis não estariam nas coisas do mundo, mas no próprio homem, pois este é possuidor das faculdades espontâneas e sua natureza transcende à natureza animal, ele é racional.

O que Kant quer dizer é que o sujeito possui as condições que possibilitam o conhecimento das coisas. Ele possui as regras pelas quais os objetos podem ser reconhecidos. Não adianta buscar regras no mundo exterior, pois se cairia no problema de Hume. O mundo não tem sentido a não ser que o homem dê algum sentido a ele. O que conhecemos é profundamente marcado pela maneira humana de conhecer.

A Metafísica dos Costumes e o fundamento moral em que pese repousem sobre as duas teorias do Direito e da Virtude, tendo o seu percurso totalmente diferenciado do percurso aristotélico, também exalta a vida racional. Também atribui ao ser humano virtude, sendo que em Aristóteles o agir virtuoso encaminha à vida feliz, enquanto a virtude kantiana encaminha para o “agir por dever”. O homem aristotélico é de “boa vida” e o homem kantiano é “boa vontade”.

Em que consiste a grandeza do homem kantiano? Conforme Manfredo Oliveira, em seu livro Ética e Sociabilidade, essa é uma pergunta proveniente da própria modernidade, pois Descarte expressou que o homem é senhor e possuidor da natureza. Por isso se auto-afirma na esfera da consciência reflexiva, na atitude nova em relação ao mundo, que é senão a característica dos tempos novos.14

Seguindo ainda o comentário de Manfredo, ele diz que o homem emerge como subjetividade à medida que é fonte de determinação do outro de si. A conquista de sua subjetividade deve-se na medida em que o outro é o seu objeto. Esta postura kantiana está profundamente influenciada pelo novo entendimento que o homem tem de mundo e esta é sua legitimação, uma vez que a filosofia transcendental é a fundamentação filosófica desse modo novo de o homem ser no mundo. A filosofia se constituirá o tribunal da razão, como avaliação critica de todo o contexto da vida humana.

Na filosofia kantiana subjaz a “intenção”, pois mostra que a verdadeira grandeza do homem não consiste na sua imposição sobre o mundo, mas antes em sua capacidade de se autodeterminar a partir da liberdade e com isso o ético é a fonte dessa grandeza. Para isso a subjetividade se apresentará como práxis enquanto liberdade cuja tarefa fundamental do discurso ético será as normas para a ação humana. Não é o filósofo quem as estabelecerá, pelo contrário, ele as encontra. Sua tarefa consiste especificamente no estabelecimento do princípio de validade dessas normas de ação.

Mas, essas normas das ações só podem ser aceitas enquanto poderem exprimir uma vontade universal, ou, como diria Kant, enquanto podem ser queridas como lei universal e isto está muito bem expresso na máxima fundante da Fundamentação da Metafísica dos costumes.

O homem como agente da ação moral, possuidor da lei universal e moral dentro de si, emerge como autofinalidade. Ele é ser racional que existe como fim em si mesmo, não simplesmente como meio para o uso arbitrário dessa ou daquela vontade, mas devendo sempre, em todas suas ações, tanto consigo como para os outros, agir como ser de razão, racional. Para isso é que surge a liberdade como uma necessidade natural, repousada na vontade, que é a causa de todos os seres vivos racionais.

A moralidade kantiana é a única condição que pode fazer do ser racional um fim em si mesmo, já expresso anteriormente, isto porque ele é como um legislador num reino dos fins possível pela liberdade da vontade quer seja membro ou chefe de si mesmo.

Na conclusão deste artigo, quero expressar que além de ser uma filosofia inovadora, Kant tem grande relevância para o estudo filosófico. Não só porque revolucionou o mundo com seus conceitos, mas porque eles também têm seus significados para nosso tempo. A resposta kantiana para o nosso século eu posso expressar assim: é possível mostrar a todos os seres humanos que somos sujeitos que apresenta o princípio necessário de um agir ético-moral, princípio estes oriundos da liberdade cognoscitiva, isto é, racional em face uma sociedade da tecnologia galopante, destruindo as relações humanas, deixando o homem apenas se relacionando com o objeto.

A racionalidade é uma conquista que resulta de um esforço que pode ser chamado de auto-aperfeiçoamento. Que a razão é que é responsável pelo desenvolvimento e o que disso não provém é irracional. Eis porque Kant é tão atual, ele coloca o sujeito sobre o objeto, ainda que comentaristas afirmem que sua filosofia deixou o homem mergulhado num solipsismo, mas ainda é e será uma filosofia fundamentadora da moral que repousa sobre o Dever e a Virtude.

 

Referências: 1 Bacharelado e Licenciatura em Filosofia pela Universidade Estadual de Fortaleza - UECE / 2 KANT, Immanuel. A Metafísica dos Costumes. Trad. Edson Bini, 1ª Edição. Edipro, S.Paulo – SP, 2003, pg. 65, §3 / 3 KANT, Immanuel, A Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Trad. Paulo Quintela. Coimbra 1948. Pg. 110, § 1. 4 KANT, Immanuel. A Metafísica dos Costumes. Trad. Edson Bini, 1ª Edição. Edipro, S.Paulo – SP, 2003, pg. 72, §1 / 10 IDEM. Pg. 237 § 1 11 IDEM. Pg. 247 §2 12 Fundação Demócrito Rocha. Curso Administração Pública e Gestão Ética. Fascículo I, citação de Oscar d’Alva e Souza Filho sobre Kant no conceito de ética. Publicação do Jornal O Povo, ano 2004, pg. 10. / 13 KANT, Immanuel. Fundamentos da Metafísica dos Costumes. Trad. Paulo Quintela. Coimbra, 1948, pg. 105, § 1 / 14 OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ed. Loyola, 1ª Ed. Pg. 130.

 

Marister Prado

Christian+ Friends of Israel

 

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